Meu cliente foi na primeira sessão e não voltou: o que houve?



Se você é psicólogo clínico com certeza já passou pela experiência de fazer uma primeira sessão atendendo um cliente que nunca mais voltou: o que poderia ser isso? Vários podem ser os fatores e hoje eu gostaria de falar sobre esse mal que afeta, especialmente, os psicoterapeutas mais jovens.

A primeira coisa que eu tenho que dizer é que, sempre existirão os clientes desesperados, que vão na primeira sessão sem ter a menor ideia do que é um processo terapêutico e que, depois de passar por esta, ou animam-se e pensam que já conseguem resolver sozinhos as suas dificuldades, ou então ficam mais ansiosos ainda porque querem resolver as coisas logo e acham que a terapia vai demorar muito e acabam desistindo.

Não podemos desprezar a existência dos casos acima, mas também temos que ter um olhar crítico para a nossa própria atuação clínica: o abandono do cliente na primeira sessão é algo recorrente no meu trabalho? Se sim, acho que você precisa refletir sobre seu fazer e suas habilidades profissionais.

Tenho visto alguns psicólogos que conseguem perceber suas dificuldades na clínica, e com isto trabalham-nas e conseguem obter melhores resultados, mas também tenho encontrado alguns que pensam que estão “fazendo tudo certo” e que o cliente é que “não estava colaborativo” – CUIDADO! Se você usa, frequentemente, este tipo de desculpa você pode estar em um sério mecanismo de defesa do ego, protegendo-se da dissonância cognitiva de perceber que sua atuação não está legal.

“O que você quer dizer, Murillo?”

Quero dizer que existem muitos fatores que influenciam nos resultados psicoterapêuticos, na criação de vínculos, na crença de que seu trabalho enquanto psicólogo é essencial e pode, realmente, ajudar a pessoa. E sobre isso eu quero tratar alguns aspectos neste texto.

Psicólogos inseguros
Em minha experiência em orientação de carreira para psicólogo, tenho visto uma dezena de profissionais inseguros com o seu próprio fazer: alguns não tiveram uma boa orientação na graduação, outros tem um quantitativo de leitura (bibliografia) muito baixa, alguns transferem seus conteúdos psicológicos de forma não saudável na clínica, outros tem dificuldades no nível interpessoal... enfim, vários são os fatores que auxiliam na formação de um psicólogo clínico inseguro.

Esta insegurança, por sua vez, acaba por gerar ansiedade no contexto terapêutico por parte do próprio profissional, e esta vai, via de regras para o próprio cliente, permeando a relação terapêutica o que faz com que o cliente não sinta segurança no atendimento: só é preciso uma sessão para o cliente sentir segurança ou não no psicólogo, o que faz com que ele escolha aderir ou não ao acompanhamento.

Psicólogos sem manejo
O segundo ponto é que existem psicólogos que não tem manejo clínico com o cliente, pelo fato de ainda terem dificuldade de terem manejo interpessoal: sim, existem muitos psicólogos que não fazem a menor ideia que são grossos, ou que não possuem a delicadeza e sensibilidade adequada para trabalhar com outras pessoas.

Isso envolve treinamento de habilidades sociais. Vou dar um exemplo: o psicólogo chega na clínica, a recepção está cheia de clientes, ele passa direto sem cumprimentar as pessoas; o psicólogo ao se despedir do seu cliente não o acompanha até a porta e não se despede cordialmente; o psicólogo não vai receber o seu cliente na recepção, simplesmente ‘grita seu nome’... enfim, estas são coisas pequenas, mas que indicam que pode estar faltando um pouco de sensibilidade por parte do terapeuta, e isso também se expressa nas consultas.




Psicólogos sem objetivos
O terceiro ponto é o seguinte: existem psicólogos que não sabem estruturar bem uma primeira sessão, fazendo com que ela seja um simples espaço para despejo da ansiedade do cliente e que o mesmo fique sem respostas ou indicativos para seus problemas.

Vou dar uma dica para vocês: o psicólogo TAMBÉM é pago para escutar, mas não é pago SOMENTE para escutar! É preciso saber dar devolutivas, orientar o cliente, ainda que seja na primeira sessão!

“Mas, Murillo, você está louco, como eu posso dar uma devolutiva na primeira sessão, eu nem conheço direito a pessoa?!”

Meu amigo, minha amiga, é possível sim! Desde que você aprenda que esta devolutiva não precise ser uma receita para a vida do sujeito, ou algo profundo demais que gere insights duradouros na vida do sujeito – o seu cliente está ali também para ter dúvidas respondidas as respeito de aspectos super simples, práticos ou objetivos da vida e você não morre ou estará traindo sua teoria por oferecer isso... onde eu entro no último ponto.

Psicólogos com crenças disfuncionais a respeito da teoria
Tem muito psicólogo que está tendo um monte de crenças disfuncionais a respeito da própria teoria que segue: “ai, mas eu não posso fazer isso porque segundo o meu autor isso é errado”, ou então “mas o autor tal nunca falou nada sobre este tipo de problema”...

Vou contar uma coisa pra vocês: uma abordagem teórica não é uma receita de fazer bolo, é um guia epistemológico, é uma forma de enxergar o mundo, o sujeito, a vida... se você precisa fazer força para usar a sua teoria, você provavelmente nunca pertenceu à ela, porque ela simplesmente deveria ter sido assimilada de uma forma que fosse “natural” para você compreender seus pressupostos.

“Como assim?”

Uma abordagem te guiará sobre como fazer algo, de forma quase instintiva, na medida em que você tenha compreendido os seus fundamentos: é igual aprender a dirigir, nas primeiras semanas você terá dificuldades, mas depois que pegar o jeito você fará aquilo tranquilamente sem ter que elaborar planos em sua cabeça, será “natural”, porque simplesmente faz parte da sua forma de ser, fazer... ou seja, você tem naturalidade.

O que acontece é que tem muito psicólogo inseguro em relação à teoria, agindo de forma mecânica, sem espontaneidade, pensando mais em como encaixar o cliente na sua teoria do que em escutá-lo e deixar com que o processo terapêutico seja conduzido de forma autônoma.

Sim, tem muito psicólogo que também acha que o autor X nunca disse algo sobre determinado sintoma ou situação, então nada pode ser feito, e que eu devo encaminhar o cliente para outra abordagem: isso é anti-científico e contraproducente. Nós temos que ter a capacidade crítica e interpretativa de dar conta de compreender os princípios expressados pela teoria, para agir de forma a não ficarmos engessados em nossos próprios referenciais teóricos, afinal de contas, se não for possível pensar sobre a teoria, estamos aderindo à dogmas religiosos, não à princípios científicos.

Mas como fazer com estas dificuldades? Cada um encontra seu próprio caminho, e não há forma de sair delas sem usar a capacidade de pensar. Com base nisto, nós aqui do Instituto Psicologia Goiânia desenvolvemos duas formações que fazem parte do PROGRAMASTART’UPSI, uma delas é:

Como fazer uma primeira sessão eficiente (que já foi realizada em 2017 e será novamente em 2018);

E a outra é:


Todas elas tem como objetivo ajudar a nossos psicólogos do Instituto a ter melhor capacidade analítica e crítica frente a seus casos, tendo assim melhores resultados (e a propósito, nós abrimos algumas vagas para o público externo).

Enfim, reflita sobre estes pontos, quem sabe eles podem te ajudar a ser um melhor psicoterapeuta. Boa sorte e um abraço! :)

-------
Sobre o autor
Murillo Rodrigues dos Santos, psicólogo (CRP 09/9447) graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (Brasil), com formação em Terapia de Casais e Famílias pela Universidad Católica del Norte (Chile). Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Goiás (Brasil). Possui formações em Gestão, Empreendedorismo e Políticas pela Fundação Getúlio Vargas (Brasil), Fundación Botín (Espanha), Fondattion Finnovarregio (Bélgica), Brown University (EUA) e Harvard University (EUA). Diretor do Instituto Psicologia Goiânia, psicólogo clínico e organizacional.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Pages